Erguer as Mãos que Pendem

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terça-feira, 25 de abril de 2017

FALTA DE JUSTA CAUSA – ART. 395, III DO CPP




O Legislador pátrio estabeleceu no artigo 395 do Código de Processo Penal quando a denúncia deve ser rejeitada. Vejamos o texto:

Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).
I - for manifestamente inepta; (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).
II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ou (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).
III - faltar justa causa para o exercício da ação penal. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).
Parágrafo único. (Revogado). (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).


O que seria a falta de Justa Causa indicada como causa de rejeição da denúncia no artigo 395, III do CPP? Guilherme Souza Nucci afirma o seguinte:
Ausência de justa causa: desdobra-se a questão em dois aspectos: a) justa causa para a ordem proferida, que resultou em coação contra alguém; b) justa causa para a existência de processo ou investigação contra alguém, sem que haja lastro probatório suficiente.[1] (grifamos)

A denúncia necessita ser suportada por um mínimo de lastro probatório, sob pena de violar direito fundamental do cidadão que se vê exposto ao vexame de uma persecução criminal, sem ter contra si provas idôneas. Veja parte de um excelente artigo sobre o tema, escrito pela juíza fluminense Eliana Alfradique, que corroborará com as ideias adrede sustentadas:

O ilustre Promotor de Justiça Afrânio Silva Jardim retrata em sua lição a fibra vital do conceito de justa causa, considerando-a quarta condição da ação:
“Justa causa é suporte probatório mínimo em que se deve lastrear a acusação, tendo em vista que a simples instauração do processo penal já atinge o chamado status dignitatis do imputado. Tal lastro probatório nos é fornecido pelo inquérito policial ou pelas peças de informação, que devem acompanhar a acusação penal”.
Weber Martins Batista, citando Ada Grinover, em decisão do TACRIM/SP, entendeu correto o não recebimento de denúncia sem esse princípio de prova, pois a mera suposição “não justifica o desencadeamento de um processo criminal, que representa, por si só, um dos maiores dramas para a pessoa humana. Por isso é que um mínimo defumo de bom direito” há de exigir-se, para que se leve adiante o processo”. (Ac. Unânime, 2ª Câm., Rel. Juiz Amaral Salles, JUTA 67/225).
A denúncia deve reportar-se  a um fato delituoso, corroborado quantum satis por elementos probatórios idôneos. O ato acusatório deve basear-se pelo menos em indícios no que concerne à autoria. Por exercitar seu controle de viabilidade da ação penal, o judiciário pode e deve examinar a prova que sustenta uma denúncia, para reconhecimento da fumaça do bom direito, o mínimo demonstrador daquelas circunstâncias: existência do crime e autoria. (...). (AC. de 18/04/1085, Rel. Juiz Lustosa Goulart, ADV, 23.311).
Para o oferecimento de uma denúncia, cuja  responsabilidade assume de seu próprio punho, exige-se do Promotor a maior ponderação, leciona Roberto Lyra. O Código de Processo Penal estabelece os requisitos da denúncia, que é inepta e fica sujeita à rejeição in limine,  se não os satisfizer. Exige-se a maior prudência, para evitar denúncias temerárias. O Promotor Público tem a responsabilidade direta de fazer assentar-se nos bancos dos réus, de incluir nos arquivos de identificação criminal de expor a ônus, vexames e escândalos de um processo criminal o denunciado. É bem sério o dever de atender às imposições de sua consciência, como órgão da ação penal, medida extrema e excepcional que inspira a mais delicada compenetração das responsabilidades funcionais, doutrina Roberto Lyra.[2]

Enfatizamos que o fato de responder a um processo criminal já é uma espécie de punição. A pessoa se vê exposta e julgada no seu meio social. Ela passará por um enorme desgaste emocional, social e, inclusive, financeiro. Portanto, o juiz da causa tem o dever de analisar se a denúncia apresenta um mínimo de lastro probatório em relação à autoria do fato, não podendo o processo servir como meio de investigação. Neste mesmo entendimento leciona o ilustre doutrinador Aury Lopes. Senão vejamos:
“A acusação não pode, diante da inegável existência de penas processuais, ser leviana e despida de um suporte probatório suficiente para, á luz do princípio da proporcionalidade, justificar o imenso constrangimento que representa a assunção da condição de réu” [3]

Repita-se, que para que haja o recebimento da denúncia, é necessário que a mesma apresente elementos informativos ou provas suficientes da autoria, de maneira que indique a plausibilidade da acusação, ou seja, um suporte mínimo de prova ou indícios suficientes de imputação. Vale rememorar a decisão do Ministro Celso de Mello que tratou do ônus da prova no processo penal [4]:

O processo penal condenatório não é um instrumento de arbítrio do Estado. Ele representa, antes, um poderoso meio de contenção e de delimitação dos poderes que dispõem os órgãos incumbidos da persecução penal. Ao delinear um círculo de proteção em torno da pessoa do réu – que jamais se presume culpado, até que sobrevenha irrecorrível sentença condenatória – o processo penal revela-se instrumento que inibe a opressão judicial e que, condicionado por parâmetros ético-jurídicos, impõe ao órgão acusador o ônus integral da prova, ao mesmo tempo em que faculta ao acusado, que jamais necessita demonstrar a sua inocência, o direito de defender-se e de questionar, criticamente, sob a égide do contraditório, todos os elementos probatórios produzidos pelo Ministério Público. (grifo nosso)

Portanto, a acusação ao oferecer uma denúncia, precisa apresentar provas ou pelo menos indícios suficientes de autoria sob pena de rejeição da denúncia por falta de justa causa para o exercício da ação penal.



[1] NUCCI, GUILHERME DE SOUZA. Código de Processo Penal Comentado. 2ª ed. São Paulo: Revista dos tribunais, 2003, p.867.

[2] A FALTA DE JUSTA CAUSA PARA INÍCIO OU PROSSEGUIMENTO DE AÇÃO PENAL REQUISITOS - DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA - ELIANE ALFRADIQUE - Mestre em Direito Público, Juíza no Rio de Janeiro.

[3] LOPES JUNIOR, Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. Vol. I. Lumen Juris: Rio de Janeiro, 2007, p. 358.
[4] S.T.F. – HC nº 73.338-7 – RS, 1ª Turma, Rel. Min. Celso de Mello, j. 7/11/89, DJU de 14/8/92, p. 12.225. ementa parcial.

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