sexta-feira, 29 de agosto de 2014
quinta-feira, 28 de agosto de 2014
Para quem não leu, aqui vai um dos capítulos do meu livro: Criminalista sim, senhor!
Quando um advogado é procurado por um futuro cliente, é comum ser indagado se o acusado será absolvido, quando será solto etc. Não raro, pauta-se o diálogo por um pedido de promessa, promessa de resultado. Nesse contexto, é possível que o advogado se sinta tentado a fazer a promessa. Talvez tenha uma autoconfiança maior que a média, ou não queira perder o cliente e, por conseguinte, os honorários. O fato, porém, é que não se deve prometer resultado.
O contrato de defesa é de meio, e não de fim. Você pode prometer empenhar-se ao máximo para alcançar o melhor resultado possível, mas não pode cair na tentação, repito, de prometer resultado. Para além da qualidade de seu trabalho, no fim das contas é o juiz quem julga, e o que pode parecer certo e até simples para você pode não parecer ao juiz.
Lembro-me, a propósito, de ter sido procurado por uma senhora para trabalhar no caso de seu irmão. Fora preso, conforme informação policial, em flagrante. E continuava na cadeia. Uma das piores delegacias em que eu já entrei. Era afastada, numa rua sem calçamento, sem saída. Não havia iluminação nem natural, nem artificial. Era fétida, embolorada. Não havia colchão, não havia comida, não havia água, não havia nada.
Após tratarmos dos pormenores do contrato e de pedir os documentos necessários para iniciar os trabalhos, fui até à famigerada delegacia, onde deparei com um homem de meia-idade, alto, magro, sorriso pequeno. Tão tímido que falava em intensidade quase inaudível. A acusação que pesava sobre ele? Homicídio.
Ele havia matado um homem que entrou em sua casa enquanto ele estava fora. Em resumo: ao chegar a casa, de madrugada, deparou-se com um estranho, que estava na garagem, com uma sacola cheia de objetos. Perguntou-lhe o que fazia ali e recebeu como resposta um golpe do que parecia ser um pedaço de madeira. Caiu tonto, mas próximo havia uma barra de ferro, parte do eixo de um velho carro. Pegou a barra de ferro e atingiu o invasor com duros golpes, pelo menos três na cabeça. O homem caiu no chão, estava morto. Meu cliente contou que ficara aperreado, sem saber o que fazer. Nunca havia passado por aquilo. Com medo de ser preso, não quis chamar a polícia, confessou. Resolveu, pois, tirar o corpo dali, colocando-o num saco plástico, na mala do carro que estava do lado de fora da casa. Em seguida, conduziu o corpo até um canavial. Feito isso, não quis voltar para casa e, como já era quase oito horas do dia, foi trabalhar.
Ocorre, no entanto, que alguém viu a cena e avisou a polícia, que foi até a casa e, não encontrando ninguém, descobriu onde meu cliente trabalhava. Na parte da tarde, lá chegaram três policiais e perguntaram por ele. Pediram que meu cliente os seguisse até a delegacia, onde lhe deram voz de prisão sob o argumento de que estava preso em flagrante pelo homicídio de um cidadão ocorrido na manhã daquele dia e que, segundo informações, o fato ocorrera dentro de sua casa. Tudo foi confirmado pelo meu cliente durante o interrogatório.
Com o conhecimento desses fatos, fiquei pensando qual seria a melhor saída. A meu ver, não havia flagrante. Meu cliente – vou chamá-lo de Joaquim – não foi preso cometendo o crime; também não houve perseguição. Ao contrário, houve diligências e investigações para saber onde se encontrava. Ele foi para a delegacia em seu próprio carro, sem nenhuma espécie de coação ou resistência. Não foi preso com os instrumentos do crime. Pensei, enfim, se o melhor seria fazer um pedido de relaxamento da prisão, já que ela era ilegal. Por outro lado, ele era primário, sem antecedentes, não resistira à prisão, tinha trabalho, residência fixa, família e acabara de constituir um defensor. As circunstâncias do crime, mesmo em tese, favoreciam-no. Era um prato cheio para pedir a liberdade provisória. Ora, o que mais importava era vê-lo fora daquela cela imunda, com sua liberdade restaurada. Na dúvida, fiz os dois pedidos na mesma peça.
Narrei como a prisão ocorrera e argumentei que não havia prisão em flagrante. No nosso sistema ou se é preso em flagrante, ou por ordem escrita de um juiz competente. E, se não havia ordem judicial e não era flagrante a prisão, deveria ser relaxada imediatamente. Também sustentei que, se o magistrado entendesse haver flagrante, como não havia necessidade de Joaquim permanecer preso, fosse concedida a liberdade provisória.
Assim procedi: fiz a peça, juntei os documentos e corri para o fórum. Dei entrada na petição e solicitei falar com o juiz da Vara do Júri, que me atendeu prontamente, escutando-me com muita atenção. Depois, afirmou que, se tudo estivesse comprovado conforme eu lhe narrara, iria conceder a liberdade provisória. Em seguida, procurei a família do cliente e disse que estava tudo certo.
Perguntaram-me, por óbvio, quando ele sairia da prisão. Eu enchi o peito e disparei: hoje! Voltei ao fórum e, para minha surpresa, vi o juiz passar pelo corredor em direção aos elevadores. Achei estranho, comecei a ficar preocupado.
Fui até à Vara, onde me informaram que o magistrado iria viajar e só voltaria na semana seguinte, segunda ou terça-feira. “E meu alvará de soltura já foi assinado?”, perguntei aflito. O juiz havia esquecido a promessa feita mais cedo. O que ele prometera? Que concederia a liberdade. O problema é que ninguém disse quando! E o problema maior é que eu já havia me comprometido ao garantir que Joaquim estaria solto naquele mesmo dia, uma quinta-feira.
Assim, não me restou alternativa: saí correndo da Vara, desci pelas escadas feito um louco! Peguei o juiz dentro do carro, no estacionamento, já de saída. Fiz sinal, ele parou. Expliquei o caso, inclusive minha imprecaução – já havia me comprometido com a família que o cliente seria solto naquele mesmo dia –, e fui advertido: “Doutor, o senhor já deve saber que não se pode prometer nada ao cliente”. Ele, muito atenciosamente, desceu do carro, voltou comigo para a Vara, redigiu a decisão e assinou o alvará de soltura.
Joaquim foi, finalmente, solto naquele mesmo dia. As promessas foram cumpridas: a que eu fiz para a família dele e a que eu fiz para mim mesmo, ou seja, de nunca mais prometer nada ao cliente, além de um trabalho sério.
NÃO PROMETA RESULTADOS
Quando um advogado é procurado por um futuro cliente, é comum ser indagado se o acusado será absolvido, quando será solto etc. Não raro, pauta-se o diálogo por um pedido de promessa, promessa de resultado. Nesse contexto, é possível que o advogado se sinta tentado a fazer a promessa. Talvez tenha uma autoconfiança maior que a média, ou não queira perder o cliente e, por conseguinte, os honorários. O fato, porém, é que não se deve prometer resultado.
O contrato de defesa é de meio, e não de fim. Você pode prometer empenhar-se ao máximo para alcançar o melhor resultado possível, mas não pode cair na tentação, repito, de prometer resultado. Para além da qualidade de seu trabalho, no fim das contas é o juiz quem julga, e o que pode parecer certo e até simples para você pode não parecer ao juiz.
Lembro-me, a propósito, de ter sido procurado por uma senhora para trabalhar no caso de seu irmão. Fora preso, conforme informação policial, em flagrante. E continuava na cadeia. Uma das piores delegacias em que eu já entrei. Era afastada, numa rua sem calçamento, sem saída. Não havia iluminação nem natural, nem artificial. Era fétida, embolorada. Não havia colchão, não havia comida, não havia água, não havia nada.
Após tratarmos dos pormenores do contrato e de pedir os documentos necessários para iniciar os trabalhos, fui até à famigerada delegacia, onde deparei com um homem de meia-idade, alto, magro, sorriso pequeno. Tão tímido que falava em intensidade quase inaudível. A acusação que pesava sobre ele? Homicídio.
Ele havia matado um homem que entrou em sua casa enquanto ele estava fora. Em resumo: ao chegar a casa, de madrugada, deparou-se com um estranho, que estava na garagem, com uma sacola cheia de objetos. Perguntou-lhe o que fazia ali e recebeu como resposta um golpe do que parecia ser um pedaço de madeira. Caiu tonto, mas próximo havia uma barra de ferro, parte do eixo de um velho carro. Pegou a barra de ferro e atingiu o invasor com duros golpes, pelo menos três na cabeça. O homem caiu no chão, estava morto. Meu cliente contou que ficara aperreado, sem saber o que fazer. Nunca havia passado por aquilo. Com medo de ser preso, não quis chamar a polícia, confessou. Resolveu, pois, tirar o corpo dali, colocando-o num saco plástico, na mala do carro que estava do lado de fora da casa. Em seguida, conduziu o corpo até um canavial. Feito isso, não quis voltar para casa e, como já era quase oito horas do dia, foi trabalhar.
Ocorre, no entanto, que alguém viu a cena e avisou a polícia, que foi até a casa e, não encontrando ninguém, descobriu onde meu cliente trabalhava. Na parte da tarde, lá chegaram três policiais e perguntaram por ele. Pediram que meu cliente os seguisse até a delegacia, onde lhe deram voz de prisão sob o argumento de que estava preso em flagrante pelo homicídio de um cidadão ocorrido na manhã daquele dia e que, segundo informações, o fato ocorrera dentro de sua casa. Tudo foi confirmado pelo meu cliente durante o interrogatório.
Com o conhecimento desses fatos, fiquei pensando qual seria a melhor saída. A meu ver, não havia flagrante. Meu cliente – vou chamá-lo de Joaquim – não foi preso cometendo o crime; também não houve perseguição. Ao contrário, houve diligências e investigações para saber onde se encontrava. Ele foi para a delegacia em seu próprio carro, sem nenhuma espécie de coação ou resistência. Não foi preso com os instrumentos do crime. Pensei, enfim, se o melhor seria fazer um pedido de relaxamento da prisão, já que ela era ilegal. Por outro lado, ele era primário, sem antecedentes, não resistira à prisão, tinha trabalho, residência fixa, família e acabara de constituir um defensor. As circunstâncias do crime, mesmo em tese, favoreciam-no. Era um prato cheio para pedir a liberdade provisória. Ora, o que mais importava era vê-lo fora daquela cela imunda, com sua liberdade restaurada. Na dúvida, fiz os dois pedidos na mesma peça.
Narrei como a prisão ocorrera e argumentei que não havia prisão em flagrante. No nosso sistema ou se é preso em flagrante, ou por ordem escrita de um juiz competente. E, se não havia ordem judicial e não era flagrante a prisão, deveria ser relaxada imediatamente. Também sustentei que, se o magistrado entendesse haver flagrante, como não havia necessidade de Joaquim permanecer preso, fosse concedida a liberdade provisória.
Assim procedi: fiz a peça, juntei os documentos e corri para o fórum. Dei entrada na petição e solicitei falar com o juiz da Vara do Júri, que me atendeu prontamente, escutando-me com muita atenção. Depois, afirmou que, se tudo estivesse comprovado conforme eu lhe narrara, iria conceder a liberdade provisória. Em seguida, procurei a família do cliente e disse que estava tudo certo.
Perguntaram-me, por óbvio, quando ele sairia da prisão. Eu enchi o peito e disparei: hoje! Voltei ao fórum e, para minha surpresa, vi o juiz passar pelo corredor em direção aos elevadores. Achei estranho, comecei a ficar preocupado.
Fui até à Vara, onde me informaram que o magistrado iria viajar e só voltaria na semana seguinte, segunda ou terça-feira. “E meu alvará de soltura já foi assinado?”, perguntei aflito. O juiz havia esquecido a promessa feita mais cedo. O que ele prometera? Que concederia a liberdade. O problema é que ninguém disse quando! E o problema maior é que eu já havia me comprometido ao garantir que Joaquim estaria solto naquele mesmo dia, uma quinta-feira.
Assim, não me restou alternativa: saí correndo da Vara, desci pelas escadas feito um louco! Peguei o juiz dentro do carro, no estacionamento, já de saída. Fiz sinal, ele parou. Expliquei o caso, inclusive minha imprecaução – já havia me comprometido com a família que o cliente seria solto naquele mesmo dia –, e fui advertido: “Doutor, o senhor já deve saber que não se pode prometer nada ao cliente”. Ele, muito atenciosamente, desceu do carro, voltou comigo para a Vara, redigiu a decisão e assinou o alvará de soltura.
Joaquim foi, finalmente, solto naquele mesmo dia. As promessas foram cumpridas: a que eu fiz para a família dele e a que eu fiz para mim mesmo, ou seja, de nunca mais prometer nada ao cliente, além de um trabalho sério.
A INCOMPATIBILIDADE ENTRE TENTATIVA E DOLO EVENTUAL
Um Estudo dirigido para a defesa de um caso sobre A INCOMPATIBILIDADE ENTRE TENTATIVA E DOLO EVENTUAL
A ação, como sabido e já estabelecido em nossa doutrina pátria, é atividade dirigida conscientemente, um acontecimento final e não meramente causal. E como bem disse Welzel, a atividade final “é uma atividade dirigida conscientemente em razão de um fim, enquanto o acontecer causal não está dirigido a um fim (...)” . Ele arremata com sua celebre frase, “a finalidade é, por isso – dito de forma gráfica – ‘vidente’, e a causalidade, ‘cega’ . E, portanto, pode-se afirmar que a questão central da ação finalista é a vontade, consciente do fim.
Para melhor demonstrar a diferença entre a ação vista de forma meramente causal da ação vista como ação final, Welzel traz o seguinte exemplo: Aquele que, para treinar tiro ao alvo, dispara contra uma árvore, atrás da qual se encontra um homem – o qual não vê – e mata esse homem, dá, sem dúvida, um disparo final de treinamento, mas não realiza uma ação final de matar. [Nesse caso], a consequência ulterior, não querida (a morte), foi produzida de um modo causal, cego, pela ação final.
A respeito do tema, precisa é a doutrina do Procurador de Justiça ROGÉRIO GRECO, que tratou da problemática conceitual da possibilidade de um crime tentado na hipótese de dolo eventual, sob a ótica da teoria finalista da ação. Vejamos: A própria definição legal do conceito de tentativa nos impede de reconhecê-la nos casos em que o agente atua com dolo eventual.
Quando o Código Penal, em seu art. 14, II, diz ser o crime tentado quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente, nos está a induzir, mediante a palavra vontade, que a tentativa somente será admissível quando a conduta do agente for finalística e diretamente dirigida à produção de um resultado, e não nas hipóteses em que somente assuma o risco de produzi-lo, nos termos propostos pela teoria do assentimento. O art. 14, II, do Código Penal adotou, portanto, para fins do reconhecimento do dolo, tão somente, a teoria da vontade.
Não sem motivos que quando Mirabete tratou da tentativa no crime de homicídio, explicou que “é com fundamento no elemento subjetivo que se distingue a tentativa de homicídio, que exige ato inequívoco de matar, do crime de lesões corporais” . O Tribunal de Justiça de São Paulo ao se manifestar em dois casos de possível tentativa de homicídio assim decidiu: A tentativa de morte exige para o seu reconhecimento atos inequívocos da intenção homicida do agente. Não basta, pois, para configurá-la, o disparo de arma de fogo e a ocorrência de lesões corporais no ofendido, principalmente quando o réu não foi impedido de prosseguir e dela desistiu. (RT 458/344) Inexistindo a certeza de que quisesse o réu matar e não apenas ferir, não apenas ferir, não se afigura a tentativa de morte. É que esta exige atos inequívocos da intenção do agente. (RT 613/293).
Como dito, sem a vontade certa de provocar o resultado, não há que se falar em tentativa. Para o jovem Promotor Público Cleber Masson a tentativa é composta por três elementos: 1) início da execução; 2) ausência de consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente; e 3) dolo de consumação. Ora, pode-se dizer então que para a consumação de um delito, primeiramente o agente começa a mentalizar o resultado que pretende alcançar; após, define os meios necessários a serem utilizados para a prática do delito que mentalizou; em seguida, começa a praticar os atos, já cogitados e preparados, necessários para a consumação do delito. Na fase da execução, ou seja, quando o agente começa a realizar os atos necessários para a configuração do fato típico, pode ocorrer duas situações, a consumação do delito, ou a sua interrupção. Essa interrupção pode se dar pela livre vontade do agente, ou por circunstâncias alheias à sua vontade. Na segunda hipótese, ou seja, quando o crime não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente, está configurada a tentativa.
A figura da vontade está diretamente ligada à tentativa, ou como disse Masson o “dolo de consumação”, pois ninguém tenta fazer algo que não quer. Tratando do querer, que nos remete a teoria da vontade, o professor Damásio diz que “é a vontade do agente que fornece o elemento subjetivo final para a configuração da tentativa, pois é ela que especifica a figura típica a que se encontram ligados os atos executórios”.
Não difere o entendimento do ilustre Professor e Promotor de Justiça no Estado do Rio de Janeiro, Fernando Pedroso, quando diz: De outra parte, é incompatível a figura da tentativa com o dolo eventual. Como não há vontade diretamente dirigida à produção do resultado, assumindo o agente apenas a possibilidade do dano ao bem jurídico penalmente tutelado, inconcusso é que ou nada se produz sequer havendo que se cogitar da forma tentada, ou se produz alguma coisa de relevância criminosa, ainda que 'menor' à prevista, e por ela deve o sujeito ativo, sob a forma consumada, ser responsabilizado criminalmente.
Já ROBERTO DELMANTO, ROBERTO DELMANTO JUNIOR e FÁBIO M. DE ALMEIDA DELMANTO, são mais diretos quando afirma que “é inadmissível se ter como tentativa de homicídio o evento não desejado” . Defendendo o mesmo posicionamento, MIRABETE, colaciona casos semelhantes ao do denunciado, explicando sobre a incompatibilidade entre tentativa de homicídio e dolo eventual.
Vejamos: Há hipóteses evidentes de impossibilidade da tentativa com dolo eventual nos crimes de homicídio e de lesões, pois quem põe em perigo a integridade corporal de alguém voluntariamente, sem desejar causar a lesão, pratica fato típico especial (art. 132); quem põe em risco a vida de alguém, causando-lhe lesão e não querendo sua morte, pratica o crime de lesão corporal de natureza grave (art. 129, §1º, II). Deve-se entender que, diante do texto legal, se punirá pelo crime menos grave quando o agente “assume o risco” de um resultado de lesão ou morte, respectivamente, que ao final não vem a ocorrer".
Vejamos trecho da decisão proveniente do Tribunal de Justiça de São Paulo, da lavra do ilustre Desembargador Breno Guimarães, no RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0832268-64.2013.8.26.0052, que de forma didática trata da analise da tentativa em caso de dolo eventual:
Ora, para a configuração do crime tentado, é necessária a vontade do agente em produzir o resultado lesivo, que não se consuma por circunstâncias alheias àquela mesma vontade (art. 14, inc. II, do CP). Tal elemento volitivo, ou seja, o querer produzir o fato descrito no tipo penal, não se encontra presente no dolo eventual, pois nele há apenas a anuência de que determinado resultado possa ocorrer. Em outros termos, no dolo eventual o agente prevê o resultado como possível ou provável, mas não se importa com a sua ocorrência, aceitando-o. Não há, portanto, a real vontade de produzir o resultado, o que o torna incompatível com o conceito de tentativa insculpido no Código Penal. Ora, para a configuração do crime tentado, é necessária a vontade do agente em produzir o resultado lesivo, que não se consuma por circunstâncias alheias àquela mesma vontade (art. 14, inc. II, do CP). Tal elemento volitivo, ou seja, o querer produzir o fato descrito no tipo penal, não se encontra presente no dolo eventual, pois nele há apenas a anuência de que determinado resultado possa ocorrer. Em outros termos, no dolo eventual o agente prevê o resultado como possível ou provável, mas não se importa com a sua ocorrência, aceitando-o. Não há, portanto, a real vontade de produzir o resultado, o que o torna incompatível com o conceito de tentativa insculpido no Código Penal. Em linguagem simples e direta, não há nenhuma lógica em tentar fazer algo que não se quer com consciência e vontade. Nesse sentido temos:
"RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. DELITOS COMETIDOS NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. HOMICÍDIO TENTADO COM DOLO EVENTUAL E EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO CONTRA A VIDA PARA OUTRO DE COMPETÊNCIA DO JUIZ SINGULAR. IMPOSSIBILIDADE LÓGICA DE ADMITIR-SE A TENTATIVA NO DOLO EVENTUAL. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. MANUTENÇÃO DA DECISÃO DE 1º GRAU. Recurso improvido". (Recurso em Sentido Estrito nº 70034503961, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Julgado em 31/03/2010). Destacamos.
"PRONÚNCIA. TENTATIVA DE HOMICÍDIO. DELITO DE CIRCULAÇÃO NO TRÂNSITO. DOLO EVENTUAL. PROVA. A submissão de quem se envolve em delito de circulação de veículos no trânsito ao julgamento popular, através de imputação de dolo eventual, exige a presença de circunstâncias excepcionais, bem determinadas, visto que a regra, em casos do gênero, é a culpa. Circunstâncias não presentes na espécie. Dificuldade, outrossim, de conciliar conceitos de crime tentado, cujo resultado só não se obtém por circunstâncias alheias à vontade do agente, com o dolo eventual, onde não há essa vontade de obtenção do resultado lesivo. Recurso provido para a desclassificação da infração". (Recurso em Sentido Estrito nº 70001042415, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Antônio Hirt Preiss, Julgado em 31/08/2000). Destacamos. Recurso em Sentido Estrito - Tentativa de Homicídio Qualificado pelo recurso que dificultou a defesa do ofendido (art. 121, § 2º, IV, c.c. art. 14, inc.II, ambos do Código Penal) - Pronúncia operada em primeiro grau de jurisdição - Recurso interposto pela defesa objetivando a desclassificação do delito para lesões corporais na condução de veículo automotor. Impossibilidade da manutenção da decisão de pronúncia - Acusado que teria, nos termos da denúncia, assumido o risco da produção do resultado naturalístico - Dolo eventual expressamente descrito na denúncia - Incompatibilidade entre o dolo eventual e a tentativa, conforme entendimento doutrinário e jurisprudencial majoritários.Impossibilidade da definição do delito pelo Tribunal, sob pena de supressão de instância e prejulgamento da matéria - Inteligência do art. 419,do Código de Processo Penal - Por maioria de votos deram provimento ao recurso para desclassificc imputação feita ao recorrente para outro crime,competência do juiz monocrático. (TJ-SP - RECSENSES: 34886120108260438 SP 0003488-61.2010.8.26.0438, Relator: Salles Abreu, Data de Julgamento: 04/09/2012, 4ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 18/09/2012)
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIO TENTADO. DECISÃO DESCLASSIFICATÓRIA. PROVA ESTREME DE DDÚVIDA DA AUSÊNCIA DE ANIMUS NECANDI. INCOMPATIBILIDADE ENTRE A TENTATIVA E O DOLO EVENTUAL. MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA DA TESE ACUSATÓRIA. DESCLASSIFICAÇÃO QUE SE IMPUNHA. Recurso improvido. (TJ-RS - RECSENSES: 70048027247 RS , Relator: Manuel José Martinez Lucas, Data de Julgamento: 18/07/2012, Primeira Câmara Criminal, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 27/07/2012)
A ação, como sabido e já estabelecido em nossa doutrina pátria, é atividade dirigida conscientemente, um acontecimento final e não meramente causal. E como bem disse Welzel, a atividade final “é uma atividade dirigida conscientemente em razão de um fim, enquanto o acontecer causal não está dirigido a um fim (...)” . Ele arremata com sua celebre frase, “a finalidade é, por isso – dito de forma gráfica – ‘vidente’, e a causalidade, ‘cega’ . E, portanto, pode-se afirmar que a questão central da ação finalista é a vontade, consciente do fim.
Para melhor demonstrar a diferença entre a ação vista de forma meramente causal da ação vista como ação final, Welzel traz o seguinte exemplo: Aquele que, para treinar tiro ao alvo, dispara contra uma árvore, atrás da qual se encontra um homem – o qual não vê – e mata esse homem, dá, sem dúvida, um disparo final de treinamento, mas não realiza uma ação final de matar. [Nesse caso], a consequência ulterior, não querida (a morte), foi produzida de um modo causal, cego, pela ação final.
A respeito do tema, precisa é a doutrina do Procurador de Justiça ROGÉRIO GRECO, que tratou da problemática conceitual da possibilidade de um crime tentado na hipótese de dolo eventual, sob a ótica da teoria finalista da ação. Vejamos: A própria definição legal do conceito de tentativa nos impede de reconhecê-la nos casos em que o agente atua com dolo eventual.
Quando o Código Penal, em seu art. 14, II, diz ser o crime tentado quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente, nos está a induzir, mediante a palavra vontade, que a tentativa somente será admissível quando a conduta do agente for finalística e diretamente dirigida à produção de um resultado, e não nas hipóteses em que somente assuma o risco de produzi-lo, nos termos propostos pela teoria do assentimento. O art. 14, II, do Código Penal adotou, portanto, para fins do reconhecimento do dolo, tão somente, a teoria da vontade.
Não sem motivos que quando Mirabete tratou da tentativa no crime de homicídio, explicou que “é com fundamento no elemento subjetivo que se distingue a tentativa de homicídio, que exige ato inequívoco de matar, do crime de lesões corporais” . O Tribunal de Justiça de São Paulo ao se manifestar em dois casos de possível tentativa de homicídio assim decidiu: A tentativa de morte exige para o seu reconhecimento atos inequívocos da intenção homicida do agente. Não basta, pois, para configurá-la, o disparo de arma de fogo e a ocorrência de lesões corporais no ofendido, principalmente quando o réu não foi impedido de prosseguir e dela desistiu. (RT 458/344) Inexistindo a certeza de que quisesse o réu matar e não apenas ferir, não apenas ferir, não se afigura a tentativa de morte. É que esta exige atos inequívocos da intenção do agente. (RT 613/293).
Como dito, sem a vontade certa de provocar o resultado, não há que se falar em tentativa. Para o jovem Promotor Público Cleber Masson a tentativa é composta por três elementos: 1) início da execução; 2) ausência de consumação por circunstâncias alheias à vontade do agente; e 3) dolo de consumação. Ora, pode-se dizer então que para a consumação de um delito, primeiramente o agente começa a mentalizar o resultado que pretende alcançar; após, define os meios necessários a serem utilizados para a prática do delito que mentalizou; em seguida, começa a praticar os atos, já cogitados e preparados, necessários para a consumação do delito. Na fase da execução, ou seja, quando o agente começa a realizar os atos necessários para a configuração do fato típico, pode ocorrer duas situações, a consumação do delito, ou a sua interrupção. Essa interrupção pode se dar pela livre vontade do agente, ou por circunstâncias alheias à sua vontade. Na segunda hipótese, ou seja, quando o crime não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente, está configurada a tentativa.
A figura da vontade está diretamente ligada à tentativa, ou como disse Masson o “dolo de consumação”, pois ninguém tenta fazer algo que não quer. Tratando do querer, que nos remete a teoria da vontade, o professor Damásio diz que “é a vontade do agente que fornece o elemento subjetivo final para a configuração da tentativa, pois é ela que especifica a figura típica a que se encontram ligados os atos executórios”.
Não difere o entendimento do ilustre Professor e Promotor de Justiça no Estado do Rio de Janeiro, Fernando Pedroso, quando diz: De outra parte, é incompatível a figura da tentativa com o dolo eventual. Como não há vontade diretamente dirigida à produção do resultado, assumindo o agente apenas a possibilidade do dano ao bem jurídico penalmente tutelado, inconcusso é que ou nada se produz sequer havendo que se cogitar da forma tentada, ou se produz alguma coisa de relevância criminosa, ainda que 'menor' à prevista, e por ela deve o sujeito ativo, sob a forma consumada, ser responsabilizado criminalmente.
Já ROBERTO DELMANTO, ROBERTO DELMANTO JUNIOR e FÁBIO M. DE ALMEIDA DELMANTO, são mais diretos quando afirma que “é inadmissível se ter como tentativa de homicídio o evento não desejado” . Defendendo o mesmo posicionamento, MIRABETE, colaciona casos semelhantes ao do denunciado, explicando sobre a incompatibilidade entre tentativa de homicídio e dolo eventual.
Vejamos: Há hipóteses evidentes de impossibilidade da tentativa com dolo eventual nos crimes de homicídio e de lesões, pois quem põe em perigo a integridade corporal de alguém voluntariamente, sem desejar causar a lesão, pratica fato típico especial (art. 132); quem põe em risco a vida de alguém, causando-lhe lesão e não querendo sua morte, pratica o crime de lesão corporal de natureza grave (art. 129, §1º, II). Deve-se entender que, diante do texto legal, se punirá pelo crime menos grave quando o agente “assume o risco” de um resultado de lesão ou morte, respectivamente, que ao final não vem a ocorrer".
Vejamos trecho da decisão proveniente do Tribunal de Justiça de São Paulo, da lavra do ilustre Desembargador Breno Guimarães, no RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 0832268-64.2013.8.26.0052, que de forma didática trata da analise da tentativa em caso de dolo eventual:
Ora, para a configuração do crime tentado, é necessária a vontade do agente em produzir o resultado lesivo, que não se consuma por circunstâncias alheias àquela mesma vontade (art. 14, inc. II, do CP). Tal elemento volitivo, ou seja, o querer produzir o fato descrito no tipo penal, não se encontra presente no dolo eventual, pois nele há apenas a anuência de que determinado resultado possa ocorrer. Em outros termos, no dolo eventual o agente prevê o resultado como possível ou provável, mas não se importa com a sua ocorrência, aceitando-o. Não há, portanto, a real vontade de produzir o resultado, o que o torna incompatível com o conceito de tentativa insculpido no Código Penal. Ora, para a configuração do crime tentado, é necessária a vontade do agente em produzir o resultado lesivo, que não se consuma por circunstâncias alheias àquela mesma vontade (art. 14, inc. II, do CP). Tal elemento volitivo, ou seja, o querer produzir o fato descrito no tipo penal, não se encontra presente no dolo eventual, pois nele há apenas a anuência de que determinado resultado possa ocorrer. Em outros termos, no dolo eventual o agente prevê o resultado como possível ou provável, mas não se importa com a sua ocorrência, aceitando-o. Não há, portanto, a real vontade de produzir o resultado, o que o torna incompatível com o conceito de tentativa insculpido no Código Penal. Em linguagem simples e direta, não há nenhuma lógica em tentar fazer algo que não se quer com consciência e vontade. Nesse sentido temos:
"RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. DELITOS COMETIDOS NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. HOMICÍDIO TENTADO COM DOLO EVENTUAL E EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO CONTRA A VIDA PARA OUTRO DE COMPETÊNCIA DO JUIZ SINGULAR. IMPOSSIBILIDADE LÓGICA DE ADMITIR-SE A TENTATIVA NO DOLO EVENTUAL. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. MANUTENÇÃO DA DECISÃO DE 1º GRAU. Recurso improvido". (Recurso em Sentido Estrito nº 70034503961, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Julgado em 31/03/2010). Destacamos.
"PRONÚNCIA. TENTATIVA DE HOMICÍDIO. DELITO DE CIRCULAÇÃO NO TRÂNSITO. DOLO EVENTUAL. PROVA. A submissão de quem se envolve em delito de circulação de veículos no trânsito ao julgamento popular, através de imputação de dolo eventual, exige a presença de circunstâncias excepcionais, bem determinadas, visto que a regra, em casos do gênero, é a culpa. Circunstâncias não presentes na espécie. Dificuldade, outrossim, de conciliar conceitos de crime tentado, cujo resultado só não se obtém por circunstâncias alheias à vontade do agente, com o dolo eventual, onde não há essa vontade de obtenção do resultado lesivo. Recurso provido para a desclassificação da infração". (Recurso em Sentido Estrito nº 70001042415, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Antônio Hirt Preiss, Julgado em 31/08/2000). Destacamos. Recurso em Sentido Estrito - Tentativa de Homicídio Qualificado pelo recurso que dificultou a defesa do ofendido (art. 121, § 2º, IV, c.c. art. 14, inc.II, ambos do Código Penal) - Pronúncia operada em primeiro grau de jurisdição - Recurso interposto pela defesa objetivando a desclassificação do delito para lesões corporais na condução de veículo automotor. Impossibilidade da manutenção da decisão de pronúncia - Acusado que teria, nos termos da denúncia, assumido o risco da produção do resultado naturalístico - Dolo eventual expressamente descrito na denúncia - Incompatibilidade entre o dolo eventual e a tentativa, conforme entendimento doutrinário e jurisprudencial majoritários.Impossibilidade da definição do delito pelo Tribunal, sob pena de supressão de instância e prejulgamento da matéria - Inteligência do art. 419,do Código de Processo Penal - Por maioria de votos deram provimento ao recurso para desclassificc imputação feita ao recorrente para outro crime,competência do juiz monocrático. (TJ-SP - RECSENSES: 34886120108260438 SP 0003488-61.2010.8.26.0438, Relator: Salles Abreu, Data de Julgamento: 04/09/2012, 4ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 18/09/2012)
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIO TENTADO. DECISÃO DESCLASSIFICATÓRIA. PROVA ESTREME DE DDÚVIDA DA AUSÊNCIA DE ANIMUS NECANDI. INCOMPATIBILIDADE ENTRE A TENTATIVA E O DOLO EVENTUAL. MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA DA TESE ACUSATÓRIA. DESCLASSIFICAÇÃO QUE SE IMPUNHA. Recurso improvido. (TJ-RS - RECSENSES: 70048027247 RS , Relator: Manuel José Martinez Lucas, Data de Julgamento: 18/07/2012, Primeira Câmara Criminal, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 27/07/2012)
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