Erguer as Mãos que Pendem

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sexta-feira, 28 de outubro de 2016

NULIDADE PELO RÉU OU PARA PREJUDICAR O RÉU?..





 NULIDADE PELO RÉU OU PARA PREJUDICAR O RÉU...?

Recentemente, chegou um caso interessante – para não dizer arrepiante – em minhas mãos. Passo a contar os fatos.
Após a audiência de instrução o magistrado intimou o Ministério Público para apresentar alegações finais e ele assim o fez. Intimou a defesa para apresentar as alegações finais, contudo a defesa não apresentou. O juiz pronunciou o réu por homicídio simples. As partes não recorreram! O juiz intimou as partes para que apresentassem as testemunhas que iriam ser ouvidas no dia do Júri. O ministério Público indicou, a defesa não. Faltava apenas marcar o dia do Júri.
Para surpresa de todos, um novo juiz ao analisar o caso, anulou, de ofício, a decisão de pronuncia, já que o réu não havia apresentado as alegações finais, tudo em honra e homenagem ao contraditório e da ampla defesa. A defesa foi intimada para apresentar a referida peça processual e mais uma vez não apresentou as alegações finais, mas peticionou no sentido que a falta de apresentação não gerava nulidade e que o Júri deveria ser marcado. O Julgador prolatou nova decisão de pronúncia, mas desta vez, pronunciou o réu por homicídio duplamente qualificado, piorando e muito sua situação, já que a pena é bem mais grave e o crime e hediondo.
Fui então procurado pelo colega advogado para examinar o caso. Chegamos a seguinte conclusão:
Primeiro ponto, não havia nenhuma nulidade a ser sanada! Nem mesmo nulidade relativa! Como bem sabido, as alegações finas em procedimento simples, caso não apresentada pela defesa e, por ventura, venha decisão de mérito, anula o processo. Contudo, em procedimento de Júri, as alegações finais não é peça essencial e, por conseguinte, sua falta não causa nulidade, desde que a defesa tenha sido devidamente intimada. O Supremo Tribunal Federal em sede de Habeas Corpus - HC 108951 RJ, publicado em 29/05/2012 – decidiu da seguinte forma:
(...) Esta Suprema Corte, inclusive, já assentou que, até mesmo o não oferecimento das alegações finais em procedimento da competência do Tribunal do Júri constitui adequada tática da acusação e da defesa de deixarem os argumentos de que dispõem para a apresentação em plenário, ocasião em que poderão surtir melhor efeito, por não serem previamente conhecidos pela parte adversária. Precedentes (HC nº 74.631/SP, Segunda Turma, da relatoria do Ministro Maurício Corrêa, DJ de 20/6/1997; HC nº 92.207/AC, Primeira Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJe de 26/10/07). 4. Habeas Corpus denegado. (grifamos)

Vejamos, nesta mesma linha, decisão do Superior Tribunal de Justiça neste sentido:
“Tribunal do júri (pronúncia). Defensor devidamente intimado (caso). Alegações finais (ausência). Nulidade (não ocorrência). 1. A ausência das alegações finais nos processos de competência do tribunal do júri não enseja a declaração de nulidade, pois, na sentença de pronúncia, não há julgamento de mérito, e sim mero juízo de admissibilidade, positivo ou negativo, da acusação formulada. Precedentes. 2. Agravo regimental improvido.”. ( STJ - AgRg no REsp: 757464 PE 2005/0094742-1, Relator: Ministro NILSON NAVES , Data de Julgamento: 29/09/2009, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/12/2009). (grifamos)

Pois bem, este era exatamente o caso dos autos. A defesa foi intimada e não se manifestou por vontade própria. A peça de defesa, no procedimento de Júri, é dispensável, já que a decisão de pronúncia não faz julgamento de mérito. Sendo certo, que a defesa ficará resguardada, seja por respeito à opção do silêncio (tática que entendeu ser a melhor para seu constituinte) nesta fase processual, seja em função de que, no plenário do Júri, será feita a defesa oral do réu.
Contudo e aqui temos um SEGUNDO ponto, mesmo que houvesse nulidade não poderia ser levantada de ofício para piorar a situação do réu, e foi o que ocorreu no caso concreto.
Havia uma decisão de pronúncia por homicídio simples, na qual manteve o réu solto, transitada em julgado (ou preclusa como muitos preferem). O Juiz, de ofício, anula a decisão (da qual não houve recurso) e prolata nova decisão de pronúncia agora por homicídio duplamente qualificado.
Mesmo que houvesse recurso da acusação - e não houve -, se a nulidade de caráter absoluto for prejudicial ao réu e não for arguida, não poderá o réu ter sua situação agravada. Vejam o exemplo dado por Grinover, Fernandes e Gomes Filho:
            ...se a invalidação favorecer ao réu, como, v.g., na hipótese de estar condenado e não ter sido regularmente citado, mesmo que a defesa não tenha arguido a nulidade, caberá ao órgão julgador proclamar a nulidade e ordenar a renovação do feito, a partir da citação, pois isso favorece o réu; se, ao contrário, tratar-se de nulidade não arguida pela acusação, mas cujo reconhecimento poderá prejudicar a defesa (como ocorreria, por exemplo, se o réu está absolvido e com a renovação do feito poderá ser condenado, diante de novas provas), aí nada restará ao tribunal senão confirmar a absolvição.[1]

        

O princípio em questão a proibição de reforma para piorar a situação do réu – Non reformatio in pejus direta ou indireta. A súmula 160 do STF, por exemplo, diz que “é nula a decisão do Tribunal que acolhe, contra o réu, nulidade não arguida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício”. Assim, mesmo que a nulidade seja absoluta, não poderá ser arguida contra o réu se não houver recurso da acusação, não sendo permitida a sua declaração ex officio.
De fato, nem mesmo erro material poderia ser corrigido de ofício para prejudicar o réu. Vejamos precedente:
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0000756-27.2013.4.03.6113/SP


2013.61.13.000756-7/SP

RELATOR
:
Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI
REL. ACÓRDÃO
:
Juiz Federal Convocado HÉLIO NOGUEIRA
APELANTE
:
ROQUE ANTONIO DE OLIVEIRA
ADVOGADO
:
SP111041 ROGERIO RAMOS CARLONI e outro
APELADO(A)
:
Justica Publica
No. ORIG.
:
00007562720134036113 1 Vr FRANCA/SP
EMENTA
APELAÇÃO CRIMINAL. CONDENAÇÃO PELO CRIME DO ARTIGO 312, §1º, C.C. ARTIGO 14, II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. RECURSO EXCLUSIVO DA DEFESA. ERRO MATERIAL NA PARTE DISPOSITIVA DA SENTENÇA. EVIDENTE CONTRADIÇÃO COM A FUNDAMENTAÇÃO. TRÂNSITO EM JULGADO PARA ACUSAÇÃO. CORREÇÃO DE OFÍCIO. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVAMENTO DA PENA. REFORMATIO IN PEJUS. PRECEDENTES DOS TRIBUNAIS SUPERIORES. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE DE UM ANO POR PENA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNICADA. APELO PROVIDO.
1. A defesa apela para que a pena restritiva de liberdade imposta seja substituída por uma multa ou por uma pena restritiva de direitos, nos termos do artigo 44, §2º, do Código Penal.
2. Fundamentação que fixou a pena em 01 (um) ano e 04 (quatro) meses de reclusão e a 07 (sete) dias-multa. Evidente erro material no dispositivo da sentença que condenou o réu à pena em 01 (um) ano de reclusão e a 05 (cinco) dias-multa.
3. Trânsito em julgado para o Ministério Público Federal.
4. Recurso exclusivo da defesa.
5. Eventual correção de ofício do erro material da parte dispositiva caracterizaria verdadeira ofensa à proibição da reformatio in pejus, uma vez que agravaria a situação do condenado.
6. Pena privativa de liberdade substituída por uma pena restritiva de direito, adequada à repressão e prevenção do delito, tendo em vista que a prestação de serviços à comunidade obriga o condenado à reparação do dano por intermédio de seu trabalho, reeducando-se enquanto perdura a pena, tornando-se preferível à pena de multa.
7. Mantida a multa originária do tipo penal fixada na sentença.
            8. Apelo provido (grifamos)

Portanto, a decisão que anulou a primeira decisão de pronúncia, salvo melhor juízo, é nula, totalmente nula! e DIGA-SE DE PASSAGEM, NUNCA FOI PELO RÉU.



[1] GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As nulidades no processo penal. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 38.

3 comentários:

  1. Boa noite.
    1- Qual o motivo da mudança do magistrado?
    2- A estratégia da defesa de não apresentar as alegações finais, é uma boa estratégia?

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  2. Não é incomum a mudança de juízes em Comarca de interior. Normalmente, no interior, não tem juiz titular. Então fica um vai e vem de juízes. Foi o que ocorreu no caso. Nesse ano específico passaram quatro juízes pela Comarca.

    Eu não gosto dessa estratégia! Mas, já vi vários advogados utilizarem.

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    1. Essa estratégia, na minha opinião é de alto risco, pois se perde uma oportunidade de expor sua tese e tentar com isso, iniciar um caminho para conseguir o objetivo de seu seu constituinte.

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