A
prisão temporária foi criada pela Lei nº 7960/1989. Apesar de toda prisão
processual ter como característica a provisoriedade, essa espécie de prisão,
diferentemente das outras, tem prazo certo para seu fim:[1] cinco
dias para os crimes comuns e trinta dias para os crimes hediondos e equiparados
(tráfico, terrorismo e tortura). Em ambos os casos pode ter o prazo renovado
por igual período.
Ela
é uma espécie de prisão cautelar voltada especificamente para as investigações,
só podendo ser decretada no curso do inquérito policial. E, tendo em mente o
sistema acusatório, ela é representada pela autoridade policial ou requerida
pelo Ministério Público, mas não pode ser decretada de ofício pelo juiz.
É
uma espécie de prisão extremamente criticada, mas bastante utilizada. Entre os
argumentos que apontam para a inconstitucionalidade da prisão temporária,
constam: 1) a inconstitucionalidade formal, pois foi criada pela medida
provisória nº 111/1989 e depois convertida na Lei nº 7.960, de 21 de dezembro
de 1989, quando a Constituição dita que é matéria privativa da União legislar
sobre matéria penal e processual penal (art. 22, I, da CF/88); e 2) a
inconstitucionalidade material seria, na verdade, uma prisão para averiguação,
em que se prende primeiro para depois investigar os fatos, violando o princípio
da presunção de inocência.[2]
Para
que a prisão temporária tenha cabimento é imprescindível que seja constatada sua extrema necessidade
para o curso das investigações policiais, não bastando meras alegações
genéricas para fundamentar tal imposição, sob pena de nulidade da decisão.
Nas
brilhantes palavras do promotor de justiça Rogério Cruz, o cabimento do
encarceramento temporário é enxergado como “o de acautelar o inquérito
policial, procedimento administrativo voltado a esclarecer o fato criminoso, a
reunir meios informativos que possam habilitar o titular da ação penal a formar
sua opinio delicti e, por outra
angulação, a servir de lastro a acusação” [3].
Continua
o ilustre representante do parquet
aduzindo que somente no caso de ocorrência concreta de situação que venha a por
em risco o desencadear das investigações e seu consequente êxito é que autoriza
a decretação da medida in cautelam na
sua modalidade temporária, o qual representa o periculum libertatis.
O
termo imprescindível tem o sentido semântico de indispensável. Dessa maneira, a
prisão objeto de considerações jurídicas somente poderá ser levada a efeito
quando for absolutamente necessária às investigações.
Aqui
é preciso diferenciar uma possível utilidade da prisão de sua
imprescindibilidade. O Procurador da República João Gualberto Garces Ramos, ao
tratar da matéria explicitou a necessidade de verificar se há
imprescindibilidade ou mera utilidade da prisão temporária. Diz ele:
Advirta-se que a utilidade, ainda
que levada em grau máximo, não se confunde com imprescindibilidade.
Imprescindível é a qualidade do que não se pode dispensar, renunciar, ao menos
sem uma perda absolutamente relevante. Útil é o que ajuda, auxilia, otimiza,
mas não é essencial.[4]
A autoridade
policial tem o dever de indicar na representação quais diligências precisa
fazer para produzir esta ou aquela prova e demonstre o porquê de a citada
diligência não poder ser feita com o indivíduo solto, ou seja, por que a prova
a ser produzida não pode se realizar sem a medida extrema de prisão. Nesse
sentido, o ensinamento de João Gualberto Garces Ramos:
Não será possível a prisão
temporária sob a simples alegação de que se trata de medida imprescindível às
investigações; será necessário que a autoridade policial ao menos descreva qual
a diligência que está a depender, para sua realização, da prisão temporária do
indiciado e em que medida a privação de sua liberdade viabilizará as ditas
diligências.[5]
Em
outra passagem, salienta:
A prisão temporária, que
exclusivamente serve ao inquérito policial é, como ele, medida cautelar.
Somente se justifica porque as investigações precisam se realizar antes do
desvanecimento dos elementos de convicção, sob pena de sua completa
inutilidade.[6]
De
se destacar que a demonstração da imprescindibilidade deve ser fundada em dados
concretos e exposta como motivação do decreto prisional, sob pena de ser ilegal
a restrição de liberdade. Vejamos algumas decisões neste sentido:
HABEAS
CORPUS – PRISÃO
TEMPORÁRIA – AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA IMPRESCINDIBILIDADE – CONCESSÃO DA
ORDEM – A prisão temporária só será decretada em caso de extrema e comprovada
necessidade (Lei nº 7.960/89, art. 2º), devendo fundar-se em fatos concretos de
que o agente, estando solto, possa frustrar ou dificultar a produção de provas.
(TJRO – HC 03.004949-0 – C.Crim. – Rel. Des. Valter de Oliveira – J.
9.10.2003).
PRISÃO
TEMPORÁRIA – DEMONSTRAÇÃO DA IMPRESCINDIBILIDADE DA MEDIDA – NECESSIDADE –
ABORDAGEM ACERCA DOS ANTECEDENTES DO AGENTE – IRRELEVÂNCIA. “Para a decretação
da prisão temporária é necessário que se demonstre a imprescindibilidade da
cautela, devendo a autoridade mencionar por que as investigações não podem
prosseguir sem a adoção da referida medida, sendo irrelevante qualquer
abordagem acerca dos antecedentes do agente, vez que tal instituto de exceção
tem pressupostos próprios, que não devem ser confundidos com os da prisão
preventiva” (TACRIM – SP – HC – rel. Di Rissio Barbosa – RJTACRIM 31/342).
Veja
bem, nos dias de hoje com tanta tecnologia, com tantas possibilidades de invasão
da vida privada, como busca e apreensão de documentos, condução coercitiva,
quebras de sigilo telefônico, bancário, fiscal etc., será que sobrou algum
motivo para a imprescindibilidade da prisão temporária? Acho que não!
Sem
generalizações, o que se tem visto é que a prisão temporária tem sido utilizada
para retirar do indivíduo preso as informações que a polícia, por uma serie de
fatores, não conseguiu de outra forma apurar.
[1] Sobre a necessidade de um prazo
máximo legalmente estabelecido para a prisão preventiva, aponta Luiz Flávio Gomes “o que se lamenta é a
inexistência de uma regra geral que coloque um termo certo (uma data certa) para
a duração das medidas cautelares”. GOMES, Luiz Flávio; MARQUES, Ivan Luiz
(Coords). Prisão e Medidas Cautelares.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 57-58.
[2] MOURA, Humberto Fernandes. Prisões
Provisórias – Evolução Legislativa e sua Análise em Face do Princípio da
Presunção de Inocência, Estado de Inocência ou da Não-Culpabilidade, Revista IOB de Direito Penal e Processual
Penal – 38 – jun-jul/2006 – p. 11-12.
[3] CRUZ, Rogério Shietti Machado.
Prisão Cautelar: dramas, princípios e alternativas. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 190.
[4] RAMOS, João Gualberto
Garcez Ramos. A Tutela de Urgência no
Processo Penal Brasileiro. Belo Horizonte: Del Rey, 1998, p. 200.
[5] RAMOS, João Gualberto Garcez Ramos.
A Tutela de Urgência no Processo Penal
Brasileiro. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 1998, p. 200-201.
[6] RAMOS, João Gualberto Garcez Ramos.
A Tutela de Urgência no Processo Penal
Brasileiro. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 1998, p. 203.

Nenhum comentário:
Postar um comentário