terça-feira, 28 de junho de 2016
POSITIVISMO JURÍDICO – A ESCOLA EXEGÉTICA
Nem tudo se resume aos crimes e as penas. Já foi dito que "quem só direito sabe, nem direito sabe". Precisamos estudar mais do que o crime e suas penas, mais do que institutos de Direito Penal e Processo Penal. Então aqui vai uma noção de hermenêutica. Um pequeno estudo que fiz sobre a escola exegética. Nele há alguns saltos, mas vale como noção.
No início do século XIX, com a revolução francesa, surge a escola da exegese. Ela teve sua instauração com o advento do Código Civil da França, conhecido como Código de Napoleão. Esta escola pretendeu reduzir todo o direito à lei. A luta pela igualdade e liberdade trouxe a necessidade da segurança jurídica. Para Napoleão e seus súditos, a Lei, mais precisamente o Codex, era a solução, sua interpretação traria a insegurança de outrora. Naquela época vigorava o princípio in claris cessat interpretatio, ou seja, se a lei é clara não necessita ser interpretada.
Como o Código de Napoleão era “perfeito em clareza,” interpretá-lo era um afronta ao imperador, à própria França. Vale lembrar que a Ordem dos Advogados da França foi fechada por ordem de Napoleão. Os advogados e mesmo os interpretes de forma geral, por interpretar o Código e encontrar falhas na lei, não eram vistos com bons olhos pelo Estado. Conta Nader: "Havia a idéia errônea de que o papel do intérprete era o de “torcer o significado das normas”, para colocá-las de acordo com o interesse do momento [...]".
Napoleão Bonaparte, que nutria insatisfação para com os advogados, tendo, inclusive, fechado a “Ordem dos Advogados da França” por vinte anos, autorizando a sua reabertura apenas em 1810, quando soube que o Código Civil da França estava sendo interpretado pelos juristas, exclamou: “O meu Código está perdido.”
Portanto, a concepção reinante no início do século XIX era que não era necessária a interpretação da lei, salvo em casos extremamente raros em que houvesse obscuridade da lei. A interpretação era tida como um mal necessário, para resolver um outro mal, a obscuridade da lei.
Para alguns autores, como, Perelman, o apogeu da escola da exegese se deu entre os anos de 1830 a 1880, quando reinou absoluta entre os juristas da época, impondo a idéia que “os códigos nada deixam ao arbítrio do interprete.”
O papel do juiz, hoje considerado como o intérprete por excelência, foi descrito como passivo e limitado a aplicar a lei que lhe era dada, satisfazendo o anseio da época por segurança jurídica.
Essa forma de pensar, de interpretar o direito conduz a uma decisão mecânica, onde o aplicador impessoal e “equidistante” das partes, dos problemas sociais e, principalmente, das consequências de suas decisões funciona como um matemático, utilizando-se de uma lógica puramente matemática, silogística.
Falando das características fundamentais do positivismo jurídico, Bobbio as resumiu em sete pontos, um deles toca diretamente a presente discussão, a saber, “o problema da interpretação”. Ele diz:
O sexto ponto diz respeito ao método da ciência jurídica, isto é, o problema da interpretação (entendendo-se o termo “interpretação” em sentido muito lato, de modo a compreender toda a atividade científica do jurista: interpretação strictu sensu, integração, construção, criação do sistema): o positivismo jurídico sustenta a teoria da interpretação mecanicista, que na atividade do jurista faz prevalecer o elemento declarativo sobre o produtivo ou criativo do direito (empregando uma imagem moderna, poderíamos dizer que o juspositivismo considera o jurista uma espécie de robô ou de calculadora eletrônica).
Ademais, como o direito era reduzido ao conjunto de leis, seria necessária uma completude do ordenamento jurídico, ou seja, que para cada situação fática, para cada conduta relevante do homem que dependesse da interferência do judiciário existisse uma lei, e apenas uma, que regulasse a situação.
O declínio da escola exegética se iniciou na metade do século XIX, quando começou uma reação contra a concepção reinante. Nader comenta que partiu de Savigny a primeira contestação fundamentada contra a escola exegética. Numa crítica aberta contra o princípio que a lei clara não necessita de interpretação, ele afirmou que “admitir um imperfeição acidental das leis, como condição necessária da interpretação, é considerá-la como um remédio a um mal, remédio cuja necessidade deve diminuir à medida que as leis se tornem mais perfeitas”.
No entanto, a finalidade da crítica de Savigny era contrapor o direito consuetudinário ao direito natural, se tornando o maior defensor da escola histórica do direito. Ao bem da verdade, somente nesse aspecto, suas ideias foram tidas como precursoras do positivismo jurídico na Alemanha. Toda ideia antijusnaturalista serve, numa última análise, de suporte para o movimento pela codificação do direito e, por conseguinte, ao juspositivismo.
No fim do séc. XIX, mesmo com uma roupagem diferente, o positivismo vigora com toda a sua força, agora com a sua força suportado pelos partidários do formalismo. O formalismo jurídico foi visto sob duas concepções: formalismo científico e o formalismo ético. Bobbio, ao dissertar sobre o formalismo, como característica da definição juspositivista do direito, afirmou:
Entende-se por formalismo científico a concepção da ciência jurídica que dá relevo predominantemente à interpretação lógico-sistemática, de preferência teleológica; segundo a concepção formalista da interpretação (característica como já vimos da escola da exegese), as concretas regulae decidendi são extraídas da norma legislativa, desconsiderando a finalidade perseguida por esta, o conflito de interesses que se deve dirimir e assim por diante, mas essencialmente com base numa operação de caráter lógico.
Entende-se por formalismo ético a concepção própria do positivismo jurídico como Weltanschauung, segundo o qual a ação justa consiste pura e simplesmente no cumprimento do dever imposto pela lei, qualquer que seja esta, qualquer que seja seu conteúdo (neste sentido se fala também de concepção legalista da moral).
Note que tanto na doutrina do formalismo científico, quanto na doutrina do formalismo ético a interpretação continua, como outrora na escola exegética, um ato meramente mecânico. Veja que na concepção do formalismo científico, “o conflito de interesses que se deve dirimir e assim por diante, mas essencialmente com base numa operação de caráter lógico”. Não sendo diferente na concepção do formalismo ético, onde a justa aplicação do direito é o que dita a lei, “qualquer que seja seu conteúdo”.
Valeu?!?!
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