Por
que tanta confusão entre concurso de agentes e formação de quadrilha ou bando?
Para a configuração do crime de
formação de quadrilha ou bando, como sabido, consiste em "associarem-se mais de três pessoas, (...), para o fim de cometer
crimes" (art. 288, caput, do Código Penal). Por sua vez, o concurso de agentes se dá, segundo o artigo 29 do Código Penal, quando "quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade".
Quando se fala de pluralidade de agentes, principalmente quando se tem mais de três pessoas concorrendo para o crime, logo surge a questão: Concurso de agentes ou crime de formação de quadrilha ou bando?
Cezar
Roberto Bittencourt faz a distinção clara sobre tal concurso aparente
normativo, qual seja a quadrilha ou bando e o concurso de pessoas:
“O crime de bando ou quadrilha, como infração autônoma, somente se
configura quando os componentes do grupo formam uma associação organizada,
estável e permanente, com programas previamente preparados para a prática de
crimes, reiteradamente, com adesão de todos. Concurso eventual de pessoas, por
sua vez, é a consciente e voluntária participação de duas ou mais pessoas na
prática da mesma infração penal. A intervenção de inúmeras pessoas (quatro ou
cinco ou mais), por si só, é insuficiente para caracterizar a formação de
quadrilha ou bando. “Ao contrário, no entanto, a simples organização ou acordo
prévio para prática de crimes previamente determinados está mais para concurso
eventual de pessoas do que para formação de quadrilha. O concurso de pessoas
compreende não só a contribuição causal, puramente objetiva, mas também a
contribuição subjetiva, que não necessita revestir-se da qualidade de acordo
prévio, como exigia a velha doutrina francesa. Segundo o magistério de
Sebastian Soler, é suficiente o conhecimento da própria ação formal, ao qual os
franceses deram um valor exagerado”.[1]
Damásio Evangelista de Jesus também contribui de
forma essencial para a distinção ora em apreço, qual seja:
“A quadrilha ou bando distingue-se do concurso de agentes nos seguintes
pontos:
a)
na
quadrilha ou bando os seus membros associam-se de forma estável e permanente,
ao passo que na co-delinqüência os sujeitos se associam de forma momentânea;
b)
na
co-delinqüência os participantes associam-se para prática de determinado crime,
antes individuado, ao passo que na quadrilha ou bando os seus componentes se
associam para a prática de indeterminado número de crimes.”[2]
Portanto, um dos elementos do
tipo penal em análise é a associação
estável ou permanente, de mais de três pessoas, ou seja, no mínimo,
quatro, para o fim de
praticar crimes, diga-se mais de um, o que em nenhum ponto restou
comprovado.
A
jurisprudência, por seu turno, também assente na mesma direção, o que não nos
causa nenhuma surpresa, a saber:
“Não há que se confundir co-participação,
que é associação ocasional para cometimento de um ou mais crimes determinados,
com associação para delinqüir, configuradora do delito de quadrilha ou bando. Para
a configuração do crime previsto no art. 288 do CP exige-se essa estabilidade”
(TJSP - AC - Rel. Evaristo dos Santos - RT 615/272).
Quadrilha ou bando - Descaracterização
- Associação que teve caráter transitório - Ausência de permanência e
estabilidade da associação criminosa, não passando de isolado concurso de
agentes - “Na verdade, a associação de todos os acusados, como bem lembrou o
douto juiz monocrático, foi para o cometimento do delito descrito na denúncia,
de forma que, segundo elementos dos autos, a associação teve caráter
transitório. Deixaram de ser produzidas provas que de modo claro, demonstrassem
a permanência e a estabilidade da associação criminosa. Tudo não passou de
isolado concurso de agentes. O certo é que o bando ou quadrilha, como delito
autônomo, só se corporifica quando os membros do grupo formam uma associação
organizada e estável, com programas preparados para a prática de crimes, com a
adesão de todos, de modo reiterado” (TJSP - AC - Rel. Silva Pinto - RT 721/423)
ROUBO PRATICADO COM USO DE ARMA DE FOGO - APREENSÃO DA RES FURTIVA NA
POSSE DOS RÉUS - Elementos suficientes para embasar a condenação. Condenação
mantida. sendo a res furtiva encontrada em poder do agente, ocorre a inversão
do ônus da prova, cabendo à defesa demonstrar a legitimidade da posse. formação
de quadrilha ou bando. Delito que, para sua caracterização, exige que além do
número de participantes seja superior a três pessoas, que haja um vínculo
associativo permanente e estável para a prática de crimes. Inexistência de um
dos elementos essenciais do tipo. Ocorrência de mero concurso de agentes.
Delito não configurado. Absolvição que se impõe. (TJSC - ACR 2005.011364-9 -
Videira - 2ª C.Crim. - Rel. Des. Maurílio Moreira Leite - J. 05.07.2005)
Portanto,
é imprescindível relembrar que a quadrilha ou o bando devem visar a prática de
crimes, mais de um crime. O dolo
genérico é o elemento subjetivo do crime de quadrilha ou bando. Ou seja, é a
vontade livre e consciente de querer se associar a outras pessoas, de forma
permanente e estável, com a finalidade de cometer crimes. Estabilidade,
permanência são características do tipo penal em comento. Exatamente o que o
difere do concurso de agentes.
Infelizmente, cada vez se vê menos o
instituto do concurso de agentes e cada vez mais o crime de formação de
quadrilha ou bando. Não precisamos “errar” tanto!
