Erguer as Mãos que Pendem

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sexta-feira, 13 de março de 2015

Por que tanta confusão entre concurso de agentes e formação de quadrilha ou bando?



Por que tanta confusão entre concurso de agentes e formação de quadrilha ou bando?


Para a configuração do crime de formação de quadrilha ou bando, como sabido, consiste em "associarem-se mais de três pessoas, (...), para o fim de cometer crimes" (art. 288, caput, do Código Penal). Por sua vez, o concurso de agentes se dá, segundo o artigo 29 do Código Penal, quando "quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade".
Quando se fala de pluralidade de agentes, principalmente quando se tem mais de três pessoas concorrendo para o crime, logo surge a questão: Concurso de agentes ou crime de formação de quadrilha ou bando?

           Cezar Roberto Bittencourt faz a distinção clara sobre tal concurso aparente normativo, qual seja a quadrilha ou bando e o concurso de pessoas:

“O crime de bando ou quadrilha, como infração autônoma, somente se configura quando os componentes do grupo formam uma associação organizada, estável e permanente, com programas previamente preparados para a prática de crimes, reiteradamente, com adesão de todos. Concurso eventual de pessoas, por sua vez, é a consciente e voluntária participação de duas ou mais pessoas na prática da mesma infração penal. A intervenção de inúmeras pessoas (quatro ou cinco ou mais), por si só, é insuficiente para caracterizar a formação de quadrilha ou bando. “Ao contrário, no entanto, a simples organização ou acordo prévio para prática de crimes previamente determinados está mais para concurso eventual de pessoas do que para formação de quadrilha. O concurso de pessoas compreende não só a contribuição causal, puramente objetiva, mas também a contribuição subjetiva, que não necessita revestir-se da qualidade de acordo prévio, como exigia a velha doutrina francesa. Segundo o magistério de Sebastian Soler, é suficiente o conhecimento da própria ação formal, ao qual os franceses deram um valor exagerado”.[1]

                      Damásio Evangelista de Jesus também contribui de forma essencial para a distinção ora em apreço, qual seja:

“A quadrilha ou bando distingue-se do concurso de agentes nos seguintes pontos:

a)      na quadrilha ou bando os seus membros associam-se de forma estável e permanente, ao passo que na co-delinqüência os sujeitos se associam de forma momentânea;
b)      na co-delinqüência os participantes associam-se para prática de determinado crime, antes individuado, ao passo que na quadrilha ou bando os seus componentes se associam para a prática de indeterminado número de crimes.”[2]

 Portanto, um dos elementos do tipo penal em análise é a associação estável ou permanente, de mais de três pessoas, ou seja, no mínimo, quatro, para o fim de praticar crimes, diga-se mais de um, o que em nenhum ponto restou comprovado.

        A jurisprudência, por seu turno, também assente na mesma direção, o que não nos causa nenhuma surpresa, a saber:

“Não há que se confundir co-participação, que é associação ocasional para cometimento de um ou mais crimes determinados, com associação para delinqüir, configuradora do delito de quadrilha ou bando. Para a configuração do crime previsto no art. 288 do CP exige-se essa estabilidade” (TJSP - AC - Rel. Evaristo dos Santos - RT 615/272).

Quadrilha ou bando - Descaracterização  - Associação que teve caráter transitório - Ausência de permanência e estabilidade da associação criminosa, não passando de isolado concurso de agentes - “Na verdade, a associação de todos os acusados, como bem lembrou o douto juiz monocrático, foi para o cometimento do delito descrito na denúncia, de forma que, segundo elementos dos autos, a associação teve caráter transitório. Deixaram de ser produzidas provas que de modo claro, demonstrassem a permanência e a estabilidade da associação criminosa. Tudo não passou de isolado concurso de agentes. O certo é que o bando ou quadrilha, como delito autônomo, só se corporifica quando os membros do grupo formam uma associação organizada e estável, com programas preparados para a prática de crimes, com a adesão de todos, de modo reiterado” (TJSP - AC - Rel. Silva Pinto -  RT 721/423)

ROUBO PRATICADO COM USO DE ARMA DE FOGO - APREENSÃO DA RES FURTIVA NA POSSE DOS RÉUS - Elementos suficientes para embasar a condenação. Condenação mantida. sendo a res furtiva encontrada em poder do agente, ocorre a inversão do ônus da prova, cabendo à defesa demonstrar a legitimidade da posse. formação de quadrilha ou bando. Delito que, para sua caracterização, exige que além do número de participantes seja superior a três pessoas, que haja um vínculo associativo permanente e estável para a prática de crimes. Inexistência de um dos elementos essenciais do tipo. Ocorrência de mero concurso de agentes. Delito não configurado. Absolvição que se impõe. (TJSC - ACR 2005.011364-9 - Videira - 2ª C.Crim. - Rel. Des. Maurílio Moreira Leite - J. 05.07.2005)

 Portanto, é imprescindível relembrar que a quadrilha ou o bando devem visar a prática de crimes, mais de um crime.  O dolo genérico é o elemento subjetivo do crime de quadrilha ou bando. Ou seja, é a vontade livre e consciente de querer se associar a outras pessoas, de forma permanente e estável, com a finalidade de cometer crimes. Estabilidade, permanência são características do tipo penal em comento. Exatamente o que o difere do concurso de agentes.
Infelizmente, cada vez se vê menos o instituto do concurso de agentes e cada vez mais o crime de formação de quadrilha ou bando. Não precisamos “errar” tanto!
 


[1] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito Penal, Parte Especial, vol. 4, São Paulo, ed. Saraiva, 2004, p. 285
[2] JESUS, Damásio de. Direito Penal, Parte Especial, vol. 3, ed. 14. São Paulo: Saraiva, p. 417.